segunda-feira, 30 de abril de 2007

Uma manhã especial, passada entre gente especial

Poderia dizer que são amigos virtuais pois há muito que se conhecem e trabalham juntos sem se conhecerem fisicamente. Mas, penso que não... São amigos bem reais. Utilizaram a Internet para se conhecer e comunicar como poderiam ter utilizado postais dos correios ou sinais de fumo.
Soube da história e do que faziam juntos através do blogue da 3za. Hoje tive o privilégio de passar a manhã com eles. São alunos de uma pequena escola perto de Ribamar, uma professora muito especial - A melhor professora do mundo, segundo as suas palavras - e uma amiga que não queria ser médica mas antes poeta, cantora e sobretudo professora...
Conheceram-se hoje, mas já eram amigos há muito tempo... A foto da amiga está colada na parede da sala ao lado dos textos que escreveu e que eles coloriram.

Hoje dramatizaram uma das suas musicas, declamaram os seus poemas, cantaram juntos o Rock da matemática e trocaram longos abraços. Eu tive o privilégio de assistir a tudo isto cheio de esperança no que pessoas especiais conseguem, e conseguirão sempre, fazer com a ajuda das tecnologias....

Um muito obrigado à 3za, à Imaz e aos alunos pelas prendas que hoje recebi.

Boa semana...

domingo, 29 de abril de 2007

Conversas sobre a pele

Um dia destes as palavras deslizaram até uma conversa sobre a pele. LP, pareceu-me, gosta de poesia erótica, coisa que sempre vi sem crítica mas com alguma distância. Nela é ainda mais difícíl a arte das palavras, para que surjam poderosas nos seus meandros de argila, em vez simples bandeiras feitas choque desfraldadas.

Fiquei algum tempo a pensar sobre esse diálogo que cada um de nós tem ou não com o nosso corpo. R, um amigo de longa data que é muito improvável que me leia, ocupado que sempre está com o destino dos seus animais, sempre foi o único que costumava perguntar-me directamente como ia o meu corpo e se estava a tratá-lo bem. Muitas vezes baixei os olhos perante a nudez das palavras que ele usava, mas aquilo fazia-me bem. Como tinha que lhe responder, tinha que pensar e portanto entrava em diálogo com a minha pele. Às vezes pedia-lhe tempo: não sei, não te sei dizer, não tenho conversado com ele.

A última vez que me fez tal coisa foi mesmo via sms, mas agora que a adolescência já passou e com ela a inibição maior, o diálogo foi feito de riso. Já cresci do tamanho dele, eu que sempre fui mais pequena. Não nos tornamos mulheres com a primeira menstruação, isso é apenas um prenúncio do que podemos algum dia ser. Provavelmente muito depende das conversas que temos com a nossa pele.

R deu-me como prenda de Natal um creme para o corpo com uma maçã verde a sorrir para mim na tampa da embalagem. Devem ser raros os homens que oferecem coisas destas. Agora que é Primavera, apetece-me mais ser parte da própria natureza e portanto abri a embalagem. Apesar do seu intenso cheiro a maçã é branco, ainda mais que a minha pele. E também é doce e macio. É, sem dúvida, uma boa ajuda à conversa.
~CC~

Às vezes...

Às vezes apetecia-me poder (re)escrever-me. Como se fosse um palimpsesto.

Bom domingo!

sábado, 28 de abril de 2007


Era bom se ninguém pudesse ver.
Não teria receio de não saber
e deixava a dança levar-me com ela
~CC~

sexta-feira, 27 de abril de 2007

Almada

Hoje fui lá. Se já vivi metade da minha vida, foi nesta cidade que vivi a maior parte dela.

1. A Fonte Luminosa - Desci a avenida em direcção a Cacilhas e... a Fonte Luminosa desapareceu. Admito que não era nenhuma obra de arte, mas o olhar estava habituado a ela. Pareceu-me outra cidade. Transfigurou-se a rotunda para deixar passar o "progresso". O Metro da margem sul. Também já não tem árvores, a avenida. Espero que, uma vez findas as obras, as replantem.

2. Almadanada - era o nome de uma livraria com música dentro. Fechou há muito. Talvez por causa da sua alma danada.

3. O Dragoeiro - era centenário e morava na Rua Cdte. António Feio. Há alguns anos subiu ao velho casco da cidade e encontrou um lugar no jardim da Casa da Cerca. Belíssima Casa da Cerca, donde vemos Lisboa no seu maior esplendor. No sítio dele foi construído um prédio modernaço e nem se suspeita do que por ali existia antes.

4. O Central - passo sem entrar. Fico com vertigens sempre que o vejo assim plastificado, desfigurado.

5. A Emídio Navarro - Olho-a e penso na entrevista da Ministra da Educação à revista Visão. Espero que não faça parte do plano de "alienação do património"...

Voltarei com as árvores da avenida, mas não tenho a certeza de não me sentir uma estranha, nesta "nova" cidade.

quinta-feira, 26 de abril de 2007

Em redor dos frutos

Amanhã é o dia da plantação das árvores. Acontece-me ter uma coisa comigo tanto tempo que acho que ela já aconteceu e é o caso desta. Mas afinal é ainda amanhã.

Entre uns frutos que pareciam brilhantes mas eram de estufa e sem cheiro, há alguns que acho que serão mesmo do campo e quero saborear bem. Um deles tem um sabor especial. Chama-se "Anestesia para a tristeza" * e é um projecto de tempos livres com crianças queimadas. Sim pode parecer estranho mas elas designam-se assim a si próprias, gostam de chamar as coisas pelos nomes. E quiseram vir dizer "como era" pela sua própria voz. E não obstante a exposição da dor ser qualquer coisa que acho sempre susceptível de muitas interpretações e algumas delas más, não podia dizer que não viessem.

E nas redes há sempre uma magia a acontecer...hoje uma estudante disse-me:
- Amanhã o que era mesmo bom era se o R. pudesse estar...ele é que fala como ninguém daquelas férias que passamos juntos.
E eu: mas o R vem, está cá amanhã.

É uma estudante que tem sido voluntária nos campos de férias para crianças queimadas e não pensou reencontrar aqui R, com o qual tem passado muitos verões.

Eu não sei se isto vale a pena, se é isto o nosso encontro, mas vou tentando.
~CC~

* Este projecto e respectiva comunicação é dinamizado pela Prof. Aldina Lucena, docente da Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Setúbal (nem a conheço, mas entrou na minha rede e já gosto dela).

O meu amigo

Sem penas ou lamentos deixou-a sair de si. Da sua vida. Não tentou retê-la.
Tinha buscado um pedaço de constância e, por isso, abriu-lhe a porta outra vez. Voltou a deixá-la entrar.
Mas, um ano depois, o desencontro tinha marcado encontro com eles pela segunda vez. O meu amigo já tinha esquecido a lição de Heraclito (não podemos entrar duas vezes no mesmo rio, porque, ao entrarmos pela segunda vez, as águas já não serão as mesmas e nós também não). Esqueceu-a nos cadernos de filosofia do 12º ano, mas retomava-a agora para alimentar a objectividade que, teimosamente, queria manter.
Afinal, a relação mais longa continuava a ser com aquele ser que, silencioso, deslizava entre o sofá e o chão, ronronando quando se esquivava às carícias. Esperava-o todo o dia, todos os dias, todas as noites.
Olho-o e pergunto-me se o dique resistirá à força das lágrimas que teima em aprisionar. Tenta desfazer com o fumo dos cigarros os nós que se instalam na garganta e deixa que o olhar se perca lá atrás, naquele Verão incendiado em que juraram amor (quase) eterno.
Lembro-me que havia música na igreja, não música religiosa, mas músicas escolhidas por eles. Lembro-me de ouvir Wonderful World, das outras não.
Hoje ofereço-lhe esta para o caminho que tem pela frente, porque acho que vai gostar, e abraço-o devagarinho porque li a etiqueta: frágil - tocar com cuidado!

Todo cambia


Cambia lo superficial
cambia también lo profundo
cambia el modo de pensar
cambia todo en este mundo


Cambia el clima con los años
cambia el pastor su rebaño
y así como todo cambia
que yo cambie no es extraño

Cambia el mas fino brillante
de mano en mano su brillo
cambia el nido el pajarillo
cambia el sentir un amante

Cambia el rumbo el caminante
aunque esto le cause daño
y así como todo cambia
que yo cambie no extraño
(...)
Cambia el sol en su carrera
cuando la noche subsiste
cambia la planta y se viste
de verde en la primavera

Cambia el pelaje la fiera
Cambia el cabello el anciano
y así como todo cambia
que yo cambie no es extraño

Pero no cambia mi amor
por mas lejos que me encuentre
ni el recuerdo ni el dolor
de mi pueblo y de mi gente

Lo que cambió ayer
tendrá que cambiar mañana
así como cambio yo
en esta tierra lejana

Cambia todo cambia
Cambia todo cambia
Cantado por Mercedes Sosa

quarta-feira, 25 de abril de 2007

Chapeus há muitos....


....mas hoje, foi este o mais estranho que vi!

Por um punhado de sal...

E nunca lhe ocorreu que a vontade de Deus possa ser que esses recursos do mundo, os quais diminuem a olhos vistos enquanto estamos aqui a falar, vão parar às mãos de almas cristãs civilizadas com um modo de vida cultural melhor do que a maioria dos selvagens atrasados do planeta?

in O canto da missão de John le Carré p. 343, Dom Quixote

Deve ser impelidos deste espírito humanitário que empresas como a Sodefor fazem, segundo a visão nº737 (p. 146), contratos onde constam artigos como:

Artigo 2. A Sodefor dá, a título de pagamento habitual de entrada na dita floresta o que se segue: 2 sacos de sal, 18 barras de sabão, 4 pacotes de café, 24 garrafas de cerveja e 2 pacotes de açucar."

Devem mesmo ter perdido a cabeça! Só em cerveja são duas grades!

Bom estava também incluído uma espécie de seguro de saúde uma vez que, no Artigo 6 se estabelecia que, em caso da morte do cônjuge ou de um parente em primeiro grau, a Sodefor facilitará (o que qererá dizer que dá ou vende mais barato?) a aquisição das pranchas para o caixão se as tiver disponíveis.

Penso que esta última parte é muito importante e com certeza custou mais um saco de café e um de açucar para o advogado que pensou e redigiu tal contrato... Não vá alguém exigir mesmo as tábuas para um caixão e a empresa, que se dedica à exploração de grandes quantidades de madeira, não ter nenhuma disponível. Seria certamente um embaraço legal que deve ser evitado!

É este o mundo em que vivemos e a Sodefor é portuguesa!

...!?:;,-"."

Às vezes quando "varro" a blogosfera lusa, interrogo-me sobre o fenómeno. Democratizado? Massificado? Anestesiante? Distractivo? Não sei. Seja como for, e com as devidas adaptações, lembrei-me disto que foi escrito a propósito dos telemóveis e do seu uso desenfreado:
"Assola o país uma pulsão coloquial que põe toda a gente em estado frenético de tagarelice, numa multiplicação ansiosa de duos, trios, ensembles, coros. (...) O falatório é causa de inúmeros despautérios, frouxas produtividades e más-criações.
Fala-se, fala-se, fala-se, em todos os sotaques, em todos os tons e decibéis, em todos os azimutes. O país fala, fala, desunha-se a falar, e pouco do que diz tem o menor interesse. O país não tem nada a dizer, a ensinar, a comunicar. O país quer é aturdir-se. E a tagarelice é o meio de aturdimento mais à mão." Mário de Carvalho, Fantasia para dois coronéis e uma piscina, Ed. Caminho, 2004
E se for também isto o que nos projecta e impele para esta "escrita bloguística"?

Bom 25.04.07

(...) "Grito vermelho num campo qualquer"
~CC~


deve haver sempre uma forma de voar

Sabemos que se há dias de prodígios, também deve haver noites e esta foi e é ainda uma delas.
Eu acho que tudo isto se passa porque há ramos que não se conformam com a sua condição e querem ser pássaros. Inventam formas de voar.
~CC~

terça-feira, 24 de abril de 2007

O "I" vai embora....

Na China ninguém nos lê...


....será que alguém tenta?
Dica do Ricardo Moraes (Café Preto)
Testar outros locais

Uma frase pequenina...

Às vezes também ando por aí pelas escolas. Digo bom dia baixinho, deixo um sorriso e fico à escuta, sentada na última cadeira, disfarçada de sombra. Esta profissão de sombra também me é muito querida.

A entrada na sala fez-se já a festa tinha começado.

Eles dançaram e cantaram e colocaram a gaivota e a papoila a voar nos seus braços pequenos. E como não podia deixar de ser (há coisas que sabemos que vão acontecer) lá lhes pediram que escrevessem sobre o que era a liberdade para eles.

E escreveram sobre passarinhos e brincadeiras e responsabilidade e respeito, recriando em muitos casos a letra da canção.

Mas o Marco, rapaz de sete anos e no 1º ano de escolaridade, escreveu assim a seguir à palavra liberdade

" É bom andar à solta".

Há manhãs que valem a pena por causa de frases pequeninas. Manhãs de Abril.
~CC~

Amanhã

Dia de muitas cores. E podia lá ter sido noutro mês, aquele dia. É de águas mil e de esperanças sem fim. Para mim (e outros tantos da minha idade), há 33 anos foi não ir à escola. Mal sabíamos nós que outras lições estavam por aprender. E tão bonitas que elas eram. Agarrei as cores e não mais deixei que me abandonassem. Decorei as canções e nunca mais lhes disse adeus. E o mofo cedeu lugar à alfazema dos jardins. As tílias e os jacarandás em flor devem ter ajudado à festa. Inebriantes odores que se libertam e nos envolvem em Abril. Lá onde eu vivia, havia pinheiros, nespereiras e roseiras que nem suspeitavam que a liberdade estava a passar por cá. Todos os anos regressa este nó de emoção estrangulado na garganta. Já não sei se choro de alegria pelo que ganhámos, se de raiva pelo que não temos conseguido fazer. Deve ser tudo junto, de certeza.

Hoje dou-vos uma canção e o meu coração com ela, que coração que não se dá tem pouca valia.

Foi bonita a festa, pá
Fiquei contente
Ainda guardo renitente um velho cravo para mim
Já murcharam tua festa, pá
Mas certamente
Esqueceram uma semente nalgum canto do jardim
Sei que há léguas a nos separar
Tanto mar, tanto mar
Sei, também, quanto é preciso, pá
Navegar, navegar
Canta primavera, pá
Cá estou carente
Manda novamente algum cheirinho de alecrim
Chico Buarque
PS: Ó João, traz daí uma flor da caixa para dar mais cor às palavras.
PS2: Não tenho cravos... espero que sirva!
PS3: Na perfeição.

segunda-feira, 23 de abril de 2007

Chás ao crepúsculo


Eu agora vou contar-te um segredo para que o divulgues.
Já não trabalho no mesmo sítio. Eu agora sirvo chás ao crepúsculo junto de um rio.

Eles chegam muito cansados e com os olhos gastos. Eu analiso cada uma das pupilas para as ver à transparência da luz que vem quando o sol se despede de nós e a lua está prestes a chegar. É o momento ideal para conhecer as pesssoas. Trago a caixa dos chás, aquela de madeira escura que veio do oriente. Analisamos o chá que combina com a sua alma e escolhemos em conjunto, combinando os nossos mundos interiores. O meu chá preferido é o de rosas vermelhas, mas nem sempre é o mais recomendado, é muito quente e inflama os corações de muita paixão e por vezes eles precisam de paz, nesses casos recomendo-lhes lilazes e flor de aniz.

Sei no que estás a pensar. Queres saber se lhes leio as mãos. Sim às vezes leio, mas com o aviso de que o destino não está nas linhas que as cruzam mas sim nas próprias mãos. Leio-as como quem brinca com um jogo antigo, forjado na cinza dos séculos.
Há por ali quem recolha animais e cuide deles, mas não eu. O meu mundo é das ervas e das flores e dos olhos e da escuta.

Também há livros espalhados por todos os lados, pintando a paisagem de letras.

Sabes eu agora sou (quase) feliz. É que eu sirvo chás ao crespúsculo. Apareces por lá?
~CC~

Livros e autores de uma vida....

O desafio não é fácil! Alguns autores tenho descoberto por acaso mas outros pela mão dos amigos ou irmãs e não é fácil enumerá-los ou entre eles escolher um!
Foi um acaso descobrir Michael Crichton e perceber que as suas histórias eram sempre melhores que os filmes que faziam com elas... Já Davis Lodge, Isabel Allende ou Rosa Lobato Faria vieram pela mão das irmãs mais velhas acompanhados de mais uns quantos... A História do Kundera é um pouco mais rebuscada... Moris West veio pela mão de uma amiga de tempos de faculdade. John Crisham veio apenas pelo Circulo de Leitores, mas só entrou realmente com Uma Casa Pintada. Recentemente entraram mais uns quantos entre os quais destaco Richar Zimler, Mário de Carvalho e Sepúlveda pelas mão da Cristina. Não me lembro quando, como ou porquê, li o primeiro de John Le Carré, mas, neste momento, o seu último está quase no fim e desculpem a pressa mas vou ler mais um bocadinho...

Não consigo escolher

Se pensar bem não consigo escolher, é mesmo l'embarras du choix. Nunca consegui. Acho que é como os amores: todos juntos me fizeram e o presente é sempre o melhor, porque é o que nos ilumina em cada dia até ao dia em que o céu se tornar obscuro... Mas, com os livros é diferente. Há momentos. Li e reli Os Maias, até lhe entender todos os recantos e descortinar todos os fru-frus das sedas da Maria Eduarda. Chorei com o Até amanhã camaradas e quis ser o herói do romance no feminino, ter uma causa e lutar por ela até ao fim. Arrepiei-me com a brisa por onde um deus se passeava pela mão do Mário de Carvalho. Com a Virgínia Wolf deixei-me crescer consciente de muitas coisas num quarto que era só meu. Os do Luís Sepúlveda, levaram-me até ao fim do mundo sempre a ler romances de amor (e outros). Todos os do Richard Zimler me abriram portas para outras leituras do judaísmo. A Sophia sempre luminosa a dizer-me que é preciso viver tudo o que se puder porque O tempo apaga tudo, menos esse longo rastro que o não vivido deixa.
Por isso, não consigo escolher e nomear mais seria demasiado fastidioso. Assim, escolho todos aqueles que me ajudam a ler-me-nos.

Novas oportunidades II

Há dias escrevi sobre este Programa (sim, eu sei que tem sido muito criticado) e defendi as vantagens de um país escolarizado vs em país analfabeto. Remeto-vos hoje, dia do livro, para um post do Rui Pena Pires que ilustra muito bem o conjunto de vantagens.

escolho dois...

Por ser o dia dele...escolho dois.

O primeiro por ser dos mais recentes o que mais me tocou. Intitula-se "À procura de Sana" e é de Richard Zimler, uma viagem à Palestina, um dos lugares mais complexos do mundo. Cada palavra nos explica mais e mais como é que o ódio pode nascer quase lado a lado com o amor e como é que eles se misturam numa grande e fina teia. Consegue ainda explicar o 11 de Setembro de forma única e absolutamente fantástica, como um voo imenso de uma mulher em direccão ao fim da sua história e das nossas histórias.

O segundo é o livro de uma vida, no sentido em que ele vive junto a nós dia a dia, sem nos largar a cabeceira da cama e o coração. Quando, para um trabalho escolar da minha filha tive que escolher um, escolhi a antologia poética de Sophia de Mello Breyner, trata-se talvez da primeira antologia dela e por isso é velho e está a desfazer-se. Tem além dos poemas do mar que fazem dele a minha escolha, a assinatura a lilás da própria Sophia e foi-me dado por um actor amigo, uma das primeiras pessoas em Portugal a morrer com Sida. Era também um dos livros da vida dele e perante a morte, deixou-o nas minhas mãos. Da minha filha, via professora dela, ouvi que que aquele livro não podia ser a minha escolha porque não tinha princípio nem meio nem fim e não contava uma história. Expliquei pacientemente que o livro estava cheio de histórias e que para ser-se livro não se precisa de ter princípio nem meio nem fim. Sei que ela percebeu e de vez em quando vai buscá-lo. Os poemas devem começar a ser lidos na infância, mesmo que nessa altura sejam apenas a música das palavras.

Tenham um bom dia com eles.
~CC~

domingo, 22 de abril de 2007

Clarividências...

Tem três anos e segue pelo passeio pela mão da mãe.
A mãe diz-lhe: afasta-te para os senhores poderem passar. Ela afasta-se e, depois de terem passado, pergunta: porque é que disseste senhores se era um senhor e uma senhora?
Tanta lógica junta e eu sem conseguir argumentar contra o masculino universal.

Ingenuidades...

Podem ser vistas aqui. Nós gostámos.

Dança entre os pinheiros


A saudade é como uma onda que começa pequena e depois se solta grande na espuma.
Saudades da dança que as meninas inventaram na relva. Saudade de as ver todas juntas a brincar.
É que ganho esperança quando as vejo vencer passo a passo o que as divide e às vezes não é pouco. Ganho esperança por ver como se juntam na criação do riso.
Não tenho a chave da luta contra o ódio de que falas. Às vezes vejo-o em tanto lado e é grande e fundo e tão destrutivo que me interrogo como continuo a viver aqui. Mas depois elas dançam e parece que rasgam na paisagem traços verdes por onde eu consigo caminhar.
A explicação é provavelmente de uma outra complexidade, assim como as respostas que procuramos e por elas é também necessário ir, precisamos falar, discutir, compreender. Mas quando se trata de inventar a esperança, só consigo usar as palavras simples. Dança entre os pinheiros e na força do teu movimento leva também o meu. Precisamos de ser muitos.
~CC~

sexta-feira, 20 de abril de 2007

Sopram ventos adversos...

Começa assim uma canção do José Mário Branco no Ser Solidário (se não estou em erro), que vinha de longe e sabia do que falava. Lembrei-me dela, hoje, ao ouvir o líder do PNR. Não vou reproduzir aqui, mas, como eu, muitos de nós devem ter ouvido e acho que não podemos ignorar...
Desenho do amigo Jean-Luc com as crianças
Dizem os especialistas que o medo se gera relativamente ao desconhecido, porque quanto ao conhecido, mesmo perigoso, mesmo arriscado, já criámos defesas. Não estou certa. Conhecemos sobejamente o que movimentos análogos engendraram no passado, prolongando memórias feridas até ao presente. Em surdina, há um labor continuado que considero perigoso. Como se a morte saísse à rua num dia assim, vai ressurgindo a espaços a expressão da violência, do racismo, da xenofobia. Vem do lado dos que não pensam com o coração e dos que exibem crânios rapados, despidos de artifícios. Sentidos únicos de brancas vertigens. Sem colorido.
Vinte skinheads foram detidos. Indícios de comportamentos xenófobos foram detectados. Mas, e os outros? Os que não rapam as cabeças mas se despem, sem qualquer pudor, de respeito pelo outro, pelo que é diferente, pelo que não gostam...
Receio a impotência perante o ódio cego e surdo. A impotência daqueles que cruzam os braços. Não quero um mundo a preto e branco.

Leva o meu barco...

Se consegues abrir os braços e voar pelo crespúsculo, vai sim.
Se preferires sair pela manhã, podes levar o meu barco. É pequeno e a remos mas podes dar um passeio. Segue pelo rio e deslumbra os teus olhos.
~CC~

quinta-feira, 19 de abril de 2007

Partir com o sol...

Diz que é para crianças...

A meio da tarde um livro poisado na mesa e cheio de bonequinhos sorriu-me, chamava-se "Gente". Abri-o.

"Estranho: há pessoas que odeiam as outras por serem diferentes. Esquecem-se de que elas próprias pareceriam diferentes, se fossem vistas por outros olhos" *

No final uma frase ficou dentro de mim: Há gente que é grande desde pequena.

Mas antes já tinha passado a manhã e a tarde, subindo e descendo escadas, abrindo e fechando portas e conversando. Conversando muito. No final a pergunta estereotipada a que não fugi: gostaram? Resposta: sim, gostámos muito, não foi assim uma seca como é muitas vezes.
Deve ser mesmo Primavera...
~CC~

* "Gente" é um livro escrito e ilustrado por Peter Spier, editado em 1991, pela editorial Estampa. Diz que é "para crianças".

Coisas...

Este descobri-o aqui

quarta-feira, 18 de abril de 2007

O futuro nas minhas mãos


As mãos disse-me. Eu ia dizer: não acredito. Eu ia dizer: está a falar comigo? o meu mundo é o da Ciência.... E depois disse: tome-as.
Ela olhou para elas algum tempo em silêncio e eu pensei que estava a ver algumas das minhas tragédias. Mas simplesmente murmurou baixinho: tem demasiadas linhas...Pensei no que um amigo adepto de religiões várias me tinha dito tinha eu apenas 15 anos: esta é a tua última vida, tu não voltas cá mais, tens demasiadas linhas, o que quer dizer que já és muito velha. Mais vidas...cresci a pensar que por causa destas linhas todas esta era a minha última, nem sequer poderia voltar transformada em alface ou coruja. Mas nunca pensei que tantas linhas tornassem as minhas mãos inaptas para qualquer leitura do futuro. Eu já ia a retirá-las e sair de mansinho quando ela começa a falar. Conta-me assim tudo da saúde, do amor, do trabalho e do dinheiro. Oiço-a em silêncio. Quando acaba, pergunto-lhe se as linhas não atrapalharam a leitura. Ela responde que sim, que são muitas e se cruzam todas e assim sendo não me pode dar tantas certezas, mas que tudo é muito provável. Perguntei-lhe então se para segurar em flores as minhas mãos serviam. Acenou com um sorriso e ficámos cumplices. Parece-me que o futuro está mais ou menos garantido.
~CC~

La tolérance

Talvez para reflectir em tempos de fanatismos... Não que cheguemos a alguma verdade, mas o simples exercício de reflexão já é válido.

"La tolérance, c'est le sérieux qui «admet chez autrui une manière de penser ou d'agir différente de celle qu'on adopte soi-même», qui respecte «la liberté d'autrui en matière de religion, d'opinions philosophiques, politiques» (Dictionnaire Paul Robert, 1964). Admettre, respecter: postures intellectuelles qui présupposent une dissymétrie fondamentale dans la relation à autrui; car qui est en position de tolérer, sinon celui qui a le pouvoir d'écraser, et ne le fait pourtant pas? A-t-on jamais vu un vaincu «tolérer» on vainqueur? Seul le maître assuré de son pouvoir peut offrir à sa bonne conscience le luxe d'admettre l'existence de celui qui ne menace plus l'exercice de sa domination (...) Pour le faible, il ne s'agit pas de tolérer mais d'obéir, ce qui est une prudence infra-morale: «Obéissez aux puissances... Le précepte est bon, mais superflu...il ne sera jamais violé», dit bien Rousseau. (...) Tolérer les opinions au nom d'une prétendue morale permissive revient bien souvent à l'aveu d'un indifférentisme réel (...).
N'y a-t-il pas au fond, dans cette attitude, l'effet d'une déchirure du lien social, qui laisse l'individu en retrait de toute relation authentique à autrui?" Claude Sahel, in Autrement, nº5, Septembre 1991.

De braço dado

Ai como eu gosto das palavras e como sonho com os meus poetas que amam as palavras (digo amam porque mesmo mortos continuam a amar, de certeza). Aqueles com quem sempre ando de braço dado.
E conversamos.
E, no fim das conversas, eles têm sempre mais palavras para me oferecerem.
E eu nunca hei-de conseguir agradecer/retribuir a dádiva, o dom.


(...)
Quanto mais envelheço
mais pueril é a luz,
mas essa vai comigo.

Eugénio de Andrade

PS: e a música, imprescindível. Vão lá ouvir o que o João trouxe com ele hoje.

terça-feira, 17 de abril de 2007

Um Sonho Infeliz ou....

... o poder das tecnologias ou, melhor ainda, o poder das pessoas....
Um Sonho Infeliz é o título de um projecto de escrita colaborativa da 3za e de uma turma de alunos do 4º ano do 1º Ciclo que ainda não conhece fisicamente. Grande parte do trabalho foi feito graças às tecnologias, que a 3za domina tão bem tendo sempre o cuidado de nos ir contando todas as suas descobertas . Por também estar ligado ao uso educativo das tecnologias apeteceu-me escrever aqui sobre esta história. Afinal foram as tecnologias que permitiram que se conhecessem virtualmente há mais de um ano quando a 3za deixou esta mensagem no blogue da turma:

(...)Quem sou eu? Sou uma aranhiça muito curiosa que vos descobriu hoje e ficou vossa fã! Beijinhos a todos e Parabéns também por este vosso espaço que está lindo! Muitos sucessos!

Foram também as tecnologias que forneceram a ferramenta para que a história tomasse corpo e fosse publicada para todo o mundo. Serão ainda as tecnologias que, no dia 30 de Abril, vão levar a 3za até junto deles como nos conta:

Dia 30 de Abril, lá vou eu de livros e viola ao ombro para finalmente os conhecer ao vivo.
Vou a conduzir. Sozinha sim (pela segunda vez para esses lados). A motivação é grande.

.. Mas devo confessar que mal comecei a pensar no que poderia escrever me apercebi que as tecnologias, embora importantes, não foram fundamentais... Fundamental foi existirem professores como a 3za e como a professora ou professor desta turma que as utilizam sem medo quando a "motivação é grande" (mesmo que isso implique conduzir sozinha) e que acreditam que:

a internet, bem usada, é um imenso espaço de liberdade (...) que nos permite encontrar e conhecer gente que vale a pena conhecer e dar passos só aparentemente pequenos...

Um grande abraço para a 3za Marques, agora que, também eu, tenho o prazer de conhecer ao vivo!

Olhar o mar...

As mangas da minha amiga

Sabes, cá ao "continente" o exotismo chegou tarde. As bananas eram a coisa mais exótica que podíamos comer, exóticas e caras, por isso as comíamos raramente. Mas tinha uma colega na Escola Primária (no nosso tempo era assim) que, com um pai marinheiro, tinha passado por uma das ex-colónias e falava-nos das mangas que comia, deliciosas, dizia. Nós, ignorantes do "Império", fazíamos da troça uma arma para esconder a ignorância e dizíamos que "mangas, só as do casaco". Já adulta, em Cabo Verde, pude recordar a minha colega e foi à sombra daquelas mangueiras que saboreei o fruto de que ela me falava 15 anos antes. Hoje, partilho contigo esse prazer e em Maio ofereço-te uns brincos em forma de cereja...

Homens tristes IV

Mas este eu não conheço. Embora também me pareça que acabou tudo bem para ele...

Consumo(IV)

No quintal da minha infância morava comigo uma mangueira. Chupar mangas era um acto de consumo onde eu me consumia naquele sumo doce. Nunca mais nenhuma fruta teve aquele sabor, coisa arrancada da árvore e comida no mesmo momento.

Mas gosto muito de cerejas e está quase a chegar o tempo delas. Nós, os que não nos resignamos a uma tristeza sem fim, conseguimos este milagre de beber a esperança, mesmo em coisas pequenas.
~CC~

Ainda o Piódão!

June Tabor

Encontrei um rasto.

A2 - Sul

Esta meia hora diária que passo dentro da minha "bolha", é-me vital. Desde que o leitor de CD resolveu deixar de me acompanhar, procurei outras companhias. É assim, com quase tudo na vida. E hoje de manhã tive uma surpresa daquelas que nos fazem dizer com os olhos bem abertos "Bolas, há quanto tempo eu não a ouvia!". Pela mão do Paulo Alves Guerra reencontrei June Tabor e lembrei-me de como tinha gostado tanto dela e de como depois a tinha esquecido. Mas soube-me tão bem ouvir outra vez aquela voz, acompanhada pelo acordeão de um nome que não consegui reter, mas vou à procura e depois digo-vos.

Consumo (III)


Consumo (II)


E também há lojas destas...
Uma pessoa até se esquece que vive num país em que há um centro comercial em cada esquina.
~CC~

Consumo (I)


Ele há lojas assim...
~CC~

segunda-feira, 16 de abril de 2007

Eu fiquei muito tempo a ver a foz do rio. Fiquei ali parada a pensar como se encontram às aguas. Eu deixei crescer mais e mais a Primavera até chegar a um lugar em mim sem possibilidade de regresso. E depois alguém dentro de mim que era eu mas era outra deu-me o sinal da contigência da volta. E eu agora estou aqui e parece que já não sei nada. Eu já desaprendi de estar aqui. Não saber bem qual é o meu lugar faz parte de mim desde o tempo da perca das certezas(assim até aos 30 eu sabia tudo o que iria ser e qual era o futuro que desejava). Mas agora as certezas são melhores, já não são alimentadas da superficialidade dos factos, das carreiras, dos saberes, elas agora desenham-se em cada tempo. Então eu sei dizer. Eu estive num tempo desenhado do mais belo que a natureza tem. E claro, por beber a luz das águas eu tornei-me mais luminosa.
~CC~

Em casa da 3za

No Sábado fui a casa da 3za e ela tinha lá isto para oferecer às visitas.

Homens tristes III (e por agora chega.)

Anos e anos a ouvir que os homens não choram. Anos e anos a receber carinho só da mãe. Ao pai, que também tinha ouvido a mesma história, cabiam os ralhos e os castigos. Anos e anos a perder-se nos labirintos da tristeza sem encontrar o caminho de saída.
Um dia, já crescido, frente à televisão, vê um anúncio a máquinas de lavar. Fabuloso, a preto e branco. Em primeiro plano, um homem lindo segura, com desvelo e um olhar transbordante de ternura, um bébé igualmente lindo. Ao fundo uma máquina de lavar em funcionamento e a frase "Ter tempo para as coisas importantes".
Quis ser assim como o homem do anúncio. Quis, assim, experimentar a leveza da ternura. Quis, assim, afastar as cortinas da tristeza e espreitar ao postigo da claridade alegre e colorida.
Anos mais tarde soube que um grupo de mulheres (daquelas que acham que a ternura e a sensibilidade são monopólio feminino) se tinha insurgido contra o anúncio e resolveu responder-lhes, através de todas as outras com quem se cruzou na vida, com um sorriso desarmante e uma ternura desmedida que tinha encontrado poiso nos filhos então nascidos.

domingo, 15 de abril de 2007

Vencendo medos e desafios....

Há dias que me perguntava se podíamos ir a um parque que fica do outro lado da vila.
Acedi, o motivo era pertinente: queria tentar transpor um desafio!
A primeira vez fiquei por baixo, pronto a suster uma eventual queda... Nas seguintes começou a passar sozinha.
Já não tinha medo... Agora tinha eu!

Homens tristes II

Tinha chegado aos 50 anos sem filhos. Durante anos e anos tinha devorado paixões como quem come gelados. Por volta dos 40 achou que aquela seria a derradeira e entregou-se inteiro. Lia-lhe os manuscritos dos romances que ela escrevia, trabalhava-os, devolvia-lhos mais nítidos. A promessa implícita de que um dia também ela se lhe entregaria inteira. Filhos? Não, era melhor assim enquanto ela não assentasse e tinham mais tempo para estarem os dois. Aquiescia de cada vez que ela tentava demovê-lo dessa ideia, sabendo que o tempo passava e que seria cada vez mais difícil gerir fraldas e biberões e noites sem dormir... Ela continuava o ofício de escrevinhadora e um dia anunciou-lhe a partida. Velho demais para ela, queria ser livre e com ele não podia. Refez-se lentamente do golpe, voltou a desenhar para crianças e foi encontrando por aí um pouco da luz que sabia perdida, levada nos olhos dela.

sábado, 14 de abril de 2007

Novas Oportunidades

Impossível compreender este país ou algumas vozes das gentes deste país. Sabemos que tem sido difícil recuperar do atraso educacional (entre outros) que quase 50 anos de ditadura fomentaram e ajudaram a sedimentar. Atraso que ainda hoje está patente nas nossas formas de pensar, de sentir, de agir. José Gil deu-nos bem conta desta nossa identidade em Portugal, o medo de existir. Mas não é por aí que quero ir, embora partilhe muitas das coisas que aí estão ditas/escritas. Isto tudo para falar da campanha Novas Oportunidades que está a ser levada a cabo pelos Ministérios da Educação e do Trabalho e Solidariedade Social. É um programa que se isolado e sem outras medidas paralelas - horários de trabalho flexíveis, melhores salários, melhores equipamentos sociais, etc.- terá alguma dificuldade em captar os públicos para o qual foi pensado, mas na sua essência - identificar, reconhecer e validar competências de pessoas que sabem fazer coisas, embora não esteja escrito nem certificado em nenhum diploma - não é uma má medida. Num país de doutores, falsos ou não, num país que vive de e para as aparências, porque é que voltar à escola há-de ser uma coisa "achincalhável". A democracia, constrói-se melhor com cidadãos informados, conscientes dos seus lugares na sociedade e do papel que podem desempenhar para transformá-la numa sociedade melhor. Os arautos que opõem democratização da educação à falta de qualidade da mesma, hão-de sempre existir, porque confundem democracia com massificação e porque bem lá no fundo sabem que o saber é uma forma de poder extraordinária que não convém difundir, porque bem lá no fundo sabem-se usufrutuários das benesses trazidas por um diploma ou por uma boa rede de relações. Eu, produto puro da escola democrática, com origens operárias e pouco escolarizadas, ficarei sempre do outro lado da barricada, aquele que defende que um povo escolarizado vale mais do que um povo analfabeto, que novas oportunidades devem ser dadas a toda a gente e que prefere um motorista de táxi diplomado, que tarde ou cedo pode fazer valer o seu diploma no mercado de trabalho a um analfabeto que, por isso mesmo, ver-lhe-á vedadas muitas portas, guardadas por guardiões arrogantes e ciosos do seu poder, do seu saber.

Homens tristes I

Camadas e camadas de tristeza pesavam-lhe nos dias mais cinzentos. Decidiu começar a despir-se. A Primavera ameaçava chegar, com avanços e recuos, mas ia chegando. Gostou da leveza, mas sempre temia que uma aragem mais brusca entrasse por uma ferida menos cicatrizada. Ainda assim, escolheu a leveza. As lágrimas que se soltavam em algumas noites de insónia ajudavam a lavar a alma e a pouco e pouco lá se ia descobrindo o colorido de risos antigos e de memórias felizes, como frescos recuperados, que teimavam em irromper pela bruma dos dias menos alentados. Às vezes, a fixação no passado triste impedia que os dias presentes lhe chegassem límpidos e brilhantes de sol e flores e não o deixavam seguir os trilhos por vir. Decidiu fazer uma promessa às flores: nunca mais as deixar morrer. Decidiu fazer-se uma promessa: nunca mais se deixar vencer, nunca mais deixar de tentar sorrir.

Para ficar registado...

A ideia foi da Cláudia que tem um blogue que ainda não conseguiu acabar.... esperemos que fique incompleto por muito mais tempo! Limitei-me a copiar a imagem de lá, para que também aqui fique registado. Aqui, na blogosfera, não precisamos de licença... pelo menos camarária! Quanto à dos autores... esperemos que não nos levem a mal por difundirmos a sua mensagem!

sexta-feira, 13 de abril de 2007

despedida breve


Eu agora vou ali a um lado de mim
fazer nascer flores.
Depois volto.
~CC~

de mal a pior...

Inconsoláveis os perdedores de 11 de Fevereiro, regressam como podem. As mulheres, felizmente já não podem ignorar, porque vêem, ouvem, lêem e, sobretudo, sentem.

A ECOGRAFIA DO PRESIDENTE

http://blogs.publico.pt/dererumnatura/

Assim dizer-lhe...

Venho por este meio comunicar-lhe que sei que as crianças recém nascidas podem ser dadas para adopção. Contudo, creia-me que não sei em que é que isso pode ajudar uma mulher a ter dentro de si uma criança por mais 7 meses e meio, desconhecendo tudo o que será o futuro que ela não lhe pode dar. Não sei como é que ela vai alimentar dentro dela um filho do qual sabe se vai ter que despedir e despedir sem saber com quem e para onde vai. Olhe que se calhar é amar mais não o colocar neste mundo. E isto, imaginando que estamos num país em que as crianças são adoptadas com dias ou poucos meses de vida. Um país assim pronto a acolher todas as crianças e a não deixar as que não são brancas e as que nascem com deficiências por mais e mais tempo nas instituições.

E agora que me lembro, também lhe queria perguntar se quando teve os seus filhos alguém perguntou à sua mulher porque os queria ter, se ela teve que dar assim uma justificação para os colocar no mundo e assinar por baixo.

Respeitosos cumprimentos,
~CC~

Mais um

TABACARIA

Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
(...)

Álvaro de Campos, 15-1-1928

E continua assim muito belo, mas demasiado extenso para o trazer todo hoje.

Demandas...

Tenho por princípio confiar nos amigos. E também tenho por princípio nunca referir o que quer que seja sem citar a fonte. Vindo de uma amiga a fonte era segura. Embora, achando um pouco palavroso, não sendo eu nenhuma especialista, não me era estranho não conhecer o escrito publicado. Por isso, postei. Procurei, depois do comentário do nosso gentil anónimo, e encontrei então uma colecção de "escritos" supostamente atribuídos a Fernando Pessoa - "uma espécie de escritos apócrifos" - também não sei por quem, nem porquê, mas é o que menos interessa. Assim, à laia de reposição da verdade e do bom nome do poeta aqui fica um dos meus heterónimos preferidos:

Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa.
Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda

Brilha, porque alta vive.

Ricardo Reis, 14-2-1933
Obrigada, leitor anónimo e volte sempre, identificado de preferência para podermos publicá-lo.
PS: não sem quem é Augusto Cury, não deve ser nenhum dos heterónimos ;), e com uma tal sonoridade só conheço a Marie (Curie).

Anónimos pacientes

Ele há anónimos com paciência (vulgo pachorra) e outros sem.
A nós que ninguém lê calhou-nos um anónimo paciente.
Veio dizer-nos assim de mansinho e educadamente que o texto do Fernando Pessoa que CGS aqui deixou pertence afinal a Augusto Cury. Fiz uma pesquisa rápida para averiguar da veracidade da coisa mas não consegui a prova científica(poderá CGS continuar a pesquisa...). Mas por acaso acho que o nosso anónimo deve ter razão (lamento, mas as regras da casa não me deixam publicá-lo, mas faço-lhe assim justiça...). Curiosamente, não me arrogando de nenhuma especialidade pessoana (ou outra), tinha dito ontem à parceira que o texto não parecia nada pessoano. E pelos vistos não é. Lá se vão os castelos...ficam as construções que cada um queira fazer com as pedras dos seus caminhos.
E claro, volte sempre. E com pachorra!
~CC~

Chiado

Como eu gosto deste cantinho da cidade. A luz é diferente e espalha-se dentro de nós levando-nos a seguir o seu rasto até ao rio. As cores estão menos desbotadas do que noutras zonas e as pessoas com quem me cruzo até parecem felizes...

quinta-feira, 12 de abril de 2007

Pedras e pedrinhas

Não me vejo a construir castelos.
Pedra a pedra um trilho na terra.
Pedra a pedra uma calçada portuguesa
Pedra a pedra um açude de um rio.

E talvez jogar contigo às 5 pedrinhas.

~CC~


Para a CGS que nos trouxe Fernando Pessoa e para a Marta que acha importantes as pedras nos caminhos.

Outros como nós...

Amostra sem valor

Eu sei que o meu desespero não interessa a ninguém.
Cada um tem o seu, pessoal e intransmissível:
com ele se entretém e se julga intangível.

Eu sei que a Humanidade é mais gente do que eu,
sei que o Mundo é maior do que o bairro onde habito,
que o respirar de um só, mesmo que seja o meu,
não pesa num total que tende para infinito.

Eu sei que as dimensões impiedosas da Vida
ignoram todo o homem, dissolvem-no, e, contudo,
nesta insignificância, gratuita e desvalida,
Universo sou eu, com nebulosas e tudo.

António Gedeão

Dúvidas

Conversa entre Marques Mendes e René Descartes a propósito das dúvidas que José Sócrates não esclareceu sobre os seus diplomas.

Marques Mendes: A dúvida é muito má conselheira. A dúvida é prejudicial!
René Descartes: Não, se for metódica!

a origem das lágrimas

As minhas Quartas, para além de outra origem para as lágrimas, são atravessadas pela ideia que gasto inutilmente as minhas tardes. Muitas vezes, dentro do carro, em direcção ao lugar onde tenho que ir, apetece-me voltar para trás. Não me lembro da última vez que desisti de um trabalho, pelo que a simples ideia da desistência me pesa, me leva às lágrimas. Lágrimas de pedra que são as de quem se confessa com as rochas. Mas é um pensamento que embora escuro é breve. Gosto de pensar em mim como alguém basicamente orientada para a luz. E foi assim que ontem, senti, talvez pela primeira vez, que saindo daquele lugar já a noite despontava, era mais o sol que estava a chegar. E continuou assim a iluminar-me pela noite dentro.
~CC~

quarta-feira, 11 de abril de 2007

Um fio a seguir

Cheguei pelo fio da 3za e fiquei presa...

Para os meus amigos tristes

Para os que me dizem que ando sempre a "vasculhar" nos baús do castelhano (da europa ou das américas) e para as que amanheceram tristes como o dia. Sabendo que é só um chuvisco...

Aquela triste e leda madrugada,
cheia toda de mágoa e de piedade,
enquanto houver no mundo saudade
quero que seja sempre celebrada.
Ela só, quando amena e marchetada saía,
dando ao mundo claridade,
viu apartar-se de üa outra vontade,
que nunca poderá ver-se apartada.
Ela só viu as lágrimas em fio,
de que uns e outros olhos derivadas
se acrescentaram em grande e largo rio.
Ela viu as palavras magoadas
que puderam tornar o fogo frio,
e dar descanso às almas condenadas.
Luís de Camões

divãs de rocha


Eu sei que a análise é mais frequente no divã dos psicanalistas, por quem nutro aliás imenso respeito. Mas são caros. E as rochas não. Por isso procuro-as para conversar. Esta imagem é de uma das minhas rochas preferidas. Costuma dizer-me que o meu coração não bate normalmente. Costuma dizer-me que ele quase se apaga nos dias tristes. Hoje, por estar triste, lembro-me dela. E por causa dela lembro o mar e quase me contento e me invento outra vez feliz.
~CC~

terça-feira, 10 de abril de 2007

As pequenas aldeias...

Quem nasce numa pequena aldeia perdida na serra fica para sempre com a nostalgia dos lugares calmos e simples.

Há pouco tempo estive no Piódão.

Penso que era capaz de ficar por lá uns tempos.

Talvez uns dias ou mesmo uns anos.

Teria uma casa de pedra com portas e janelas azuis.

Talvez tomasse conta de um pequeno negócio, ou, quem sabe, simplesmente deixasse os dias passar por mim sem lhes resistir!

Dis-moi ce qui ne va pas

Dis-moi ce qui ne va pas
Car tu mets de l'ombre sur mes joies
Quand je vois tes yeux tristes ou fâchés
Je suis perdu dans mes pensées.
Dis-moi ce qui ne va pas
Sais-tu que je souffre autant que toi
Ce soir nous vivons en étrangers,
Pressés de finir la soirée.
Si tu veux faire un effort,
Je reconnaîtrai mes torts
On ne peut pas vivre, on ne peut pas vivre,
Au silence du remords.

Dis-moi ce qui ne va pas,
Nous ne pouvons pas en rester là
Tu en as trop dit ou pas assez,
Pour fuit encore la vérité.
Dis-moi ce qui ne vas pas,
Au lieu de vivre à moitié sans moi
Quand on est à deux sur un bateau,
On doit connaître ses défauts.
Nous sommes bien assez grands,
Pour affronter tous les temps
On ne peut pas vivre, on ne peut pas vivre,
Toujours à l'abri du vent.

Viens te blottir dans mes bras,
Souris-moi et puis embrasse-moi
Laisse-moi sécher tes yeux rougis
Maintenant que l'on s'est tout dit.
Dis-moi ce qui ne va pas
Chaque fois que ton cœur m'en voudra
Les reproches ne me font pas peur,
Car je veux garder mon bonheur.

Enrico Macias

O figo....


Como o "prometido é de vidro" aqui fica o tal figo (consciente, ou não!).

Plantações

Gosto de plantar árvores.Imagino que me dão cores como estas.
Mas por mais engenharia social que se aprenda, o resultado é sempre incerto. É assim a natureza...
Estão absolutamente convidados.
~CC~

A veces me siento como un águila en el aire

Estados de ánimo
A veces me siento como un águila en el aire.
Pablo Milanés
Unas veces me siento como pobre colina
y otras como montaña de cumbres repetidas.
Unas veces me siento como un acantilado
y en otras como un cielo azul pero lejano.
A veces uno es manantial entre rocas
y otras veces un árbol con las últimas hojas.
Pero hoy me siento apenas como laguna insomne
con un embarcadero ya sin embarcaciones
una laguna verde inmóvil y paciente
conforme con sus algas sus musgos y sus peces,
sereno en mi confianza
confiando en que una tarde te acerques y te mires,
te mires al mirarme.
Mário Benedetti

segunda-feira, 9 de abril de 2007

Nostalgia


¿De qué se nutre la nostalgia?
Uno evoca dulzuras
cielos atormentados
tormentas celestiales
escándalos sin ruido
paciencias estiradas
árboles en el viento
oprobios prescindibles
bellezas del mercado
cánticos y alborotos
lloviznas como pena
escopetas de sueño
perdones bien ganados
pero con esos mínimos
no se arma la nostalgia
son meros simulacros
la válida la única nostalgia es de tu piel.
Mario Benedetti

entre a razão e os sentidos (2)

TIMOR LESTE

Da razão
A Democracia é o único modelo político que se pode exportar e dizer que tem um mínimo de qualidade.

Dos sentidos
Este povo ainda anda à procura de si próprio.
Este povo talvez não precise de importações.

~CC~

PS-(permaneço como observadora atenta desse mundo distante do qual pouco ou nada sei).

entre a razão e os sentidos (1)



A coisa mais inteligente que possuo é a minha pele.
~CC~

domingo, 8 de abril de 2007

Congelar momentos....

Fotografar é isso... Poder trazer para casa a luz que esteve nos nossos olhos!
Nem sempre conseguimos trazer tudo o que gostaríamos. Porque não cabe... porque foi impossível fazer o click no momento certo...
Mas, com um pouco de imaginação, podemos refazer o resto e reviver um entardecer junto ao mar...

Emoção

O que me comove?

Adultos capazes de tornarem possíveis os sonhos das crianças.

Foi isto a minha Páscoa.

~CC~

De volta das perguntas

Perguntei-lhe.
Como faço para sobreviver ao peso do mundo em mim?
Silêncio como resposta.
Perguntei-lhe.
O que faço se perder o mapa?
Silêncio como resposta.
Perguntei-lhe.
Achas que sou capaz de continuar a tentar acender o sol na ponta dos meus dedos?
...
Sim, eu sei, sou eu que tenho que responder às minhas perguntas.

Mas trago o cheiro do mar respirado das rochas. E também uma estrela feita de gente deitada na areia.
~CC~

Águas Altas...

Não é mau sitio para se viver....
Acabo de ver o filme e de dar uma boas gargalhadas. No entanto o que ficou foi a nostalgia das coisas simples, de viver num local calmo, e das paixões por gente de espanha, sem olhar à razão e muito menos à cultura...



Não percam vale a pena rir um bocado e pensar nos efeitos do mundo virtual!

Domingo

Mar e sol e areia. Brisa suave, pés descalços e mãos dadas. Pouca gente. Soube bem a caminhada da manhã. Água azul turquesa e a orla da praia cravejada de madrepérola como uma jóia. Foi assim a manhã. Depois chegou a hora de almoço. Havia ovos de Páscoa e Coelhinhos de chocolate escondidos no quintal da avó, no meio da salsa, dos coentros e das batatas que hão-de brevemente ser comidas cozidas com pele e tudo e um fiozinho de azeite. Fizemos uma espécie de pedipaper e elas encontraram tudo o que estava escondido. Riram alto e divertiram-se e eu senti saudades de ter tido uma infância assim. Que nunca tive. Agora é já noite e chove. Felizmente amanhã ainda estamos de férias e a cidade está à nossa espera para fotografarmos mais portas.

sexta-feira, 6 de abril de 2007

Impressões

Fios de prata enfeitam o Tejo na manhã do meu café. É num cais de onde partem barcos e gentes e ideias e sonhos e...
Eu fico, ao sol. Gosto de ouvir as outras gentes das mesas próximas. Hoje, um músico de jazz fala dos eus projectos com uma mulher linda que costumo ver na minha rua. Não sei quem é, só que é linda. A ele conheço-o, gosto do que faz. Vejo e escuto e gostava de entrar na história. Gostaria de chegar naturalmente e dizer "Bom dia, gosto de ouvir o que toca e, a si, gosto de a ver. Às vezes quando me cruzo consigo na rua, acho que tem luz dentro." Não faço nada disso, escuto simplesmente, olho simplesmente e penso no que me impede de entrar na história. A razão ou a cultura. Regresso ao meu livro do momento Razão e Cultura de Ernest Gellner .

quinta-feira, 5 de abril de 2007

O céu aqui tão perto!

Boa Páscoa para todos(as)

quarta-feira, 4 de abril de 2007

urgência(s)

Tenho urgência em descansar de mim. Ou em encontrar-me comigo.
Encosto uma mão na rocha. Encosto a outra. Depois o meu rosto. Posso sentir o cheiro do mar nesta rocha. Nunca soube explicar bem o efeito deste lugar em mim. Lugar onde a areia que deixo entrar nos meus pés encontra amiúde seixos pretos e redondos. Apetece dissolver-me, misturar-me com as coisas, espalhar-me nelas. Imagino que elas levam os fantasmas que atravessam os meus dias e depois me devolvem a eles cor da água. Parece que vai chover. Parece que vai fazer frio. Parece que não devo ir.
Eu vou. Talvez volte mais forte. Ou cor da água.
~CC~

Com quem?

Ir à praia? Trocar umas ideias sobre o assunto? Fazer falar uns poetas? Ouvir uns lobos? Ir à feira? Enfim, conversar...ou desconversar?
Por exemplo, com quem não nos lê mas até nos vê...e até tem assim três entradas como nós e faz pontes.

CCF
CGS
JVT

Onde?

Talvez aqui...
Praia fluvial numa pequena aldeia a poucos quilómetros de Sabugal

...ainda os lobos

Há lobos para serem vistos e ouvidos por aqui.

Porquê?...

Há uns anos atrás, por causa de laços e nós que a vida faz e desfaz, precisei de recorrer àquilo que no linguajar dos experts se chama "ajuda especializada". Sempre renitente a estas ajudas que vêm de fora, lá fui e até gostei do "especialista". Era um oficial da escuta, tinha sido treinado para o ser. As minhas perguntas mais constantes passavam sempre por um "mas para quê?", ao que ele, pacientemente, respondia, "não vá por aí, será melhor perguntar porquê?". Dava-me um trabalhão, encontrava tantos caminhos possíveis quantas respostas inconciliáveis, mas andava...e parava... e voltava atrás. Abria e fechava portas e gavetas, algumas com a chave lá dentro. Eram falsas.
O conhecimento é assim feito e a ciência, essa, já não é sagrada. Por isso, lembrei-me a propósito do post da parceira CCF, de um livrinho que li há já algum tempo mas que lhe recomendo: Será preciso queimar Descartes?, de Guitta Pessis-Pasternak, Relógio d'Água. No Prólogo, René Thom - matemático das «catástrofes» ou: a aventura científica em risco de heresia, diz o seguinte: "Cada disciplina arrasta assim os seus «mártires», irritados, frustrados, ignorados pelos sistema de reconhecimento. A comunidade científica, como qualquer outra, é cruel!"

terça-feira, 3 de abril de 2007

Para quê?

um congresso em montesinho*

depois de três dias de
comunicações e mesas redondas sobre
a conservação do lobo
o capuchinho vermelho pediu
a palavra e disse
tudo muito certo
mas como é que eu levo
o lanche
à minha avó?


Penso e penso na resposta a dar ao capuchinho vermelho...faço umas alíneas:
a)mas não compreendeu como? (é a técnica de devolver a pergunta ao interlocutor, esperando que seja ele a responder, pedido de ajuda implicíto por baixo de alguma arrogância)
b)não é esse o problema aqui em discussão (sublinhar ao interlocutor que deve estar mais atento, que a resposta que procura não está aqui)
c)há que pesquisar mais, tentar ainda saber qual o caminho melhor(reconhecer que ainda não chegámos ao conhecimento que possa reverter para a prática, reconhecer os limites...por mais que custe não há linearidade...)
d)mas nós não estamos aqui para encontrar respostas, andamos à volta das perguntas pelo prazer que elas nos trazem, para construir o conhecimento pelo valor do conhecimento(creio que isto será difícil para o capuchinho, mas tem muito de verdade)
e)...
f)...

~CC~
(isto tudo por causa das perguntas das filhas da companheira cgs e por causa delas... da pergunta da minha).


*José Carlos Barros. In Revista 365, org. de Fernando Alvim e José Luís Peixoto
www.revista365.com

De regresso....

O passeio acabou!
A Plaza Maior estava linda....
Consegui encontrar a rã!
Agora temos que voltar ao trabalho!

segunda-feira, 2 de abril de 2007

Ofício da escuta

Parece que todos estão lentamente a sair dos seus lugares em busca de um outro em que possam descansar uns dias, deixar os caminhos de sempre, ver outros rostos, tomar café fora do sítio do costume. Precisamos respirar (deve ser o que andam a fazer os meus dois companheiros de "ninguém lê").

Vario também os meus caminhos mas não para repousar(ainda), mas para respirar um outro estar.

Desconheço caminhos que já foram meus e penso como é possível já me perder neles. Quando deixei a cidade acho que o último autocarro tinha por designação carreira 93. Como é possível que seja agora o 327 a conduzir-me até aos lugares em que preciso estar em silêncio para escutar o que outros têm a dizer? De qualquer modo gostei particularmente desta carreira, percorre alguns lugares bonitos e, sobretudo, deixa-me ver várias vezes o rio.

Pratico o ofício da escuta. Primeiro ela: fala cerca de uma hora e 39 minutos. Depois ele, fala cerca de uma hora e 47 minutos. Gravo ou tomo notas, ao sabor da decisão deles. Quase não falo, fico a ouvir as suas hsitórias. Sei que os faço sentir importantes porque o somos sempre quando alguém nos escuta. A partir dos caminhos traçados por eles vou desenhar outros até preencher o meu mapa. Se conseguir, se encontrar o sentido para as ruas, travessas, largos e avenidas.

Gosto particularmente deste ofício da escuta.

~CC~

domingo, 1 de abril de 2007



Gosto de me deitar debaixo delas a medir quanto céu consigo ver. Medir que é como quem diz agarrar, ter, beijar. Em pequena, como quase todos nós, sonhava lá ter uma casa pequenina para morar mais perto daquele azul. Achava que se o conseguisse tocar os meus dedos iam ficar daquela cor. Agarrar azul.
~CC~

Ouvir o cinema no teatro

Parece estranho mas é possível ouvir o cinema no teatro. 30 de Março, Rodrigo Leão, CD "O cinema", Teatro S. João em Palmela. Vi o primeiro espectáculo que ele deu no CCB, há mais de um ano. Nada a ver com isto que agora nos traz e não sei bem porquê. É o calor, julgo eu. É que aqui há mais festa. É que aqui estamos mais próximos.

E a Celina aqui a dançar com o seu acordeão parece ainda maior. O sorriso do Rodrigo pode ver-se e sentir-se.

Batemos muitas, muitas palmas.

Muitas vezes me tenho interrogado sobre o trabalho do poder local, sobre a repetição de modelos políticos gastos que à escala micro se tornam ainda mais pequenos, mais ridículos. Mas a verdade é que foi a autarquia que o trouxe e que tornou possível pagar aqui quase metade do que paguei no CCB. Dirão que há coisas mais urgentes, mas a cultura nunca é urgente, ela faz-se dessa maravilha que é ser aparentemente dispensável. Ela é urgentemente única e faz de nós unicos como seres humanos.
~CC~

PS- E depois do elogio, o lamento. Não sei como foi possível deixar morrer aqui em Palmela o FIAR!