terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

Sem...

Babel não ganhou o óscar esperado. Não vi o outro filme, o premiado, mas é um realizador por quem tenho muito respeito. Suspeito que não é só não ter ganho, é ter perdido. É o que essa perca pode representar, é a suspeita de que são os americanos no seu pior. Li no Público de Sexta Feira passada que os críticos detestaram Babel pela sua mensagem tão obviamente política. Também respeito os críticos, suspeito até que é a melhor profissão do mundoe garanto-vos que isto não é nenhuma crítica. E entendo que o óbvio pode ter um efeito diferente do pretendido. Mas por outro lado, o filme não é um acto condenatório, um veredicto, um julgamento. Pelo contrário, se a força e o poder rimam quase sempre com uma bandeira, essa bandeira nem sempre se agita com e por um só vento. Acho que no entanto não me devo preocupar, afinal o filme ganhou. Sem estatueta mas com o cinema cheio e muitos olhos com água no final, uma comoção na última nota de som, na última imagem. Trocámos olhares cumplices, pois é...os óscares perderam Babel.
~CC~

sábado, 24 de fevereiro de 2007


capturado em http://www.expo-klimt.com/


Às vezes também me apetece adormecer assim, enrolada como num novelo.

~CC~




sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007

José Afonso....

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007

23 de Fevreiro de 1987

Faz amanhã vinte anos que Zeca Afonso morreu.
Ainda hoje quando oiço os seus discos me assalta uma nostalgia e uma profunda comoção. Não gosto desta sensação de perda, quase de orfandade, que me deixa a morte dos que, de uma maneiro ou de outra, me iluminaram os dias, com as suas notas, as suas ideias, os seus escritos.

Lamento o facto de, por aqui, nada se ter feito para recordar (uma forma de lhe dar vida outra vez) esta figura. Mas as coisas são como são...e os amigos são sempre maiores que o pensamento.

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

Dias de Carnaval

Antes que a voragem dos dias venha inundar o tempo com que me olhei, deixa-me contar.
Há pequenas parcelas de terra onde as vinhas de tão antigas já não dão vinho mas uma espécie de pão para a alma, impedem que a morte venha tomar o lugar dos vivos.
Há pequenos rios de leite que alimentam com a sua doçura o que pode ser uma família e quem os põe a correr é uma mulher com um sorriso lindo num rosto rude.
Há crianças que se vão entendendo mesmo que do seu entendimento nos chegue alguma estranheza do que as faz entenderem-se, muitos nós tecnológicos mas outras vezes nós de conversa e nós verdes.
Há um sótão onde os dedos inventam amor sobre a pele e de novo e outra vez e para que possa constar no universo.
Há o regresso onde o calor ainda vem contigo mas chega o frio de um outro lado e por mensagem telepática.
Dias contados estes que agora na volta teimam em anunciar-me um futuro tão sem esperança.
Dias passados estes, onde a tua boca sempre que se chega, anuncia essa esperança, esse sol.
Dias de Carnaval.

~CC~

terça-feira, 20 de fevereiro de 2007

Esquecido ao lado da ponte....

A poucos metros de uma das grandes obras do final do Séc. XX está este barco, esquecido, a apodrecer lentamente em pleno Séc. XXI....

Menina do gás...

Confesso que não gosto (nem desgosto) particularmente do Carnaval. Contudo, de entre os foliões que este ano aproveitaram a quadra para se mascararem (ou tirarem a máscara) destaco a "Menina do gás" que estava um espanto!

Bom resto de semana... agora que a festa acabou!

sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007

Optimismo....

Sempre gostei de pessoas optimistas. Pessoas que conseguem sempre ver o lado positivo das coisas. Pessoas que não choram o leite derramando e não gastam os seus dias num constante lamento. Talvez por isso goste tanto da companhia das parceiras que fazem parte do grupo de pessoas que encara a vida com um sorriso nos lábios. Essas pessoas optimistas são bem diferentes daquelas que culpam tudo e todos pelo que lhes vai acontecendo e que parecem ter sempre razões para estar infelizes.

É por gostar de pessoas optimistas (e de textos bem escritos) que gostei tanto de ler este post, no blogue "Respirar o mesmo ar", que nos fala de como perder um telemóvel pode ter aspectos positivos!

Mas... não comecem agora a esquecer os telemóveis nos taxis para ter uma desculpa para ligarem aos amigos, há razões bem mais simples para o fazer e tenho a certeza que eles vão adorar!
Bom Carnaval e... sejam optimistas

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

Ela está em todo o lado...

Há dias em que ela vem espreitar-me e pede para entrar em mim a todo o momento. Penso que se a deixar entrar estou perdida porque não consigo fazer outra coisa que não seja respirá-la. Se me fechar para ela fico mais tranquila mas corro o risco de o cinzento me tomar. Explico-vos.

Ontem, fui eu ao encontro dela, queria ir...foi ali na casa Fernando Pessoa, a voz de Afonso Dias*, trouxe até nós esse pastor que morava numa cidade e criava ovelhas dentro de um escritório e por se querer tanto deslumbrar com uma flor deslumbra-nos com o olhar do pastor que olha a flor. Depois seguiram-se histórias fascinantes sobre o nosso poeta mais fascinante. Estava certo, eu tinha ido à procura dela e por momentos ela tomou-me mesmo nos braços. Disse-lhe: vem!

Mas hoje não era suposto. Apareceu enquanto estudava Ciências da Natureza com a minha filha que amanhã tem teste. Devia suspeitar porque o título do Manual era "Terra Viva", qualquer coisa que tem logo algum calor. É que há nós e entrenós nos caules aéreos. E os entrenós são mesmo esses espaços entre nós, assim uma espécie de intervalo, tempo, silêncio (não, se calhar não é bem isto). E há gemas e gomos e estes são uma espécie de "botão que dá origem", como quem diz que se o sol chegar com alguma água e Primavera, a vida é coisa que provavelmente desperta (não sei se é bem isto). E as nervuras são canais onde circulam as seivas, que é como quem diz estradas para a ternura poder passar quando o escuro nos insiste em aparecer (não podes dizer assim isto no teste). Deixa ver agora os os limbos...então não é que são feitos de páginas; uma página verde mais escura e outra mais clara, como quem nos diz que há dias assim também em nós, escuro como quem entristece e claro como quem amanhece (é melhor desistir de estudar contigo!). Disse-lhe: vai! (mas volta, mas volta...)

~CC~


* Afonso Dias é um declamador de poesia, dos poucos que nos sobram. Diz bem, diz bonito. E publicou um CD em que nos traz o Guardador de Rebanhos do Caeiro que era o Pessoa. Procurem, não deixem a poesia abandonar-vos.

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

(a)trevo-me...

(a)trevo-me a dizer que achei um trevo de quatro folhas.
Não nascem, ao contrário do que nos dizem, no meio dos outros.
Nascem sim de uma outra semente, mais ou menos prima, mais ou menos irmã.
Mas não é por ser raro que gosto dele mas pelo seu tom de verde. Tem um olhar meigo e doce, dobra-se com o vento e quando penso que não vai resistir devolve-me um sorriso e diz que não vai ceder. Pergunto-lhe se veio para me dar sorte. Diz que não, que eu é que sou a sorte dele. Digo-lhe que preciso de sorte e ele responde que sorte é contrário de amor e que tenho que escolher. Fico com o amor. O amor é uma sorte acontecer-nos e isso também é raro, a mim parece-me cada vez mais raro. E frágil, como o trevo verde lindo.
~CC~

Captado em http://www.flickr.com/photos/robertadefelippe/

Adaptação às novas tecnologias

A adaptação às novas tecnologias nunca foi fácil!



Sketch emitido pela televisão da Noruega, mas felizmente legendado em inglés.
Recuperado de eCuaderno

domingo, 11 de fevereiro de 2007

Apesar da chuva



...e graças a todos os que disseram Sim à vida, sem ironias, nem hipocrisias, mas com amor. Apesar de tudo a mensagem passou e a partir de 2007, em Portugal, deixará de ser crime uma mulher escolher se quer ou não ter um filho não desejado. Apesar de tudo, hoje a escolha foi mais clara e as vontades mais límpidas. A nuvem da abstenção existe, eu sei, mas também é verdade que por toda a parte em que são realizados, os referendos são sempre menos frequentados do que as outras eleições. O nosso país não é excepção. Mas não me apetece abrir aqui um discurso técnico, isso fica para os analistas. Apetece-me sobretudo partilhar a alegria possível, que é bastante, a tranquilidade possível e necessária para dormir melhor esta noite e para pensar que as mulheres deste país terão, neste domínio, um futuro mais justo e menos envergonhado. Lentamente, a claridade instalou-se apesar do céu cinzento e insinuou-se no meu espírito aquela canção do Chico Buarque de que gosto tanto e apeteceu-me deixá-la convosco, como um imenso abraço.

Apesar de você
Chico Buarque
Hoje você é quem manda
Falou, tá falado
Não tem discussão, não.
A minha gente hoje anda
Falando de lado e olhando pro chão.Viu?
Você que inventou esse Estado
Inventou de inventar
Toda escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar o perdão.
Apesar de você amanhã há de ser outro dia.
Eu pergunto a você onde vai se esconder
Da enorme euforia?
Como vai proibir
Quando o galo insistir em cantar?
Água nova brotando
E a gente se amando sem parar.
Quando chegar o momento
Esse meu sofrimento
Vou cobrar com juros. Juro!
Todo esse amor reprimido,
Esse grito contido,
Esse samba no escuro.
Você que inventou a tristeza
Ora tenha a fineza de “desinventar”.
Você vai pagar, e é dobrado,
Cada lágrima rolada
Nesse meu penar.

Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Ainda pago pra ver
O jardim florescer
Qual você não queria.
Você vai se amargar
Vendo o dia raiar
Sem lhe pedir licença.
E eu vou morrer de rir
E esse dia há de vir antes do que você pensa.
Apesar de você

Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Você vai ter que ver
A manhã renascer
E esbanjar poesia.
Como vai se explicar
Vendo o céu clarear, de repente,
Impunemente?
Como vai abafar
Nosso coro a cantar,
Na sua frente.
Apesar de você

sexta-feira, 9 de fevereiro de 2007

Amarras....

Enquanto não começo o meu curso intensivo sobre metáforas e poesia deixo aqui uma imagem (sem palavras), captada esta tarde nos Moinhos de Maré.

Votos de bom fim-de-semana. Quanto a mim... rumo para sul e volto a tempo de ajudar o "SIM" a vencer.

O Sim censurado!

Vejam aqui.

11 de Fevereiro está quase aí...

Eu sei, eu sei que já nos cansa, mas à medida que se aproxima o dia 11 o frenesim cresce. Só vim aqui postar hoje para vos ligar aqui. Não fiquem em casa e se possível sejam radicais.

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007


Diz-me que existes. Diz-me que me posso agarrar a ti. Diz-me que és mais forte que as ondas. Diz-me que não vais ao fundo com o primeiro vento. Diz-me que és vermelha como o sangue que nos corre por dentro. Diz-me que és de verdade. Diz-me que dentro do teu abraço se pode viver. Diz-me que não duvide, diz-me que não duvide assim tanto. Deixa que me agarre e mergulhe um pouco à procura de conchas e diz-me que estás aí quando eu voltar.
~CC~

Uma pausa para... fotografar!


Podemos fazer uma pausa para tomar café, olhar pela janela... fotografar. Aqui fica a minha pausa desta manhã chuvosa e cheia de sol!

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007

Quando a diferença não faz sentido...

Elas nasceram como cogumelos, elas expandiram-se em todas as direccções, elas significaram "desenvolvimento", elas eram o orgulho dos autarcas, dos políticos, dos arautos das boas novas...que seria de um país sem um vasto e ambicioso Sistema de Ensino Superior?! Lá fomos embalados em mais uma conversa semelhante à da campanha do Trigo, da Soja, das "Minhocas"...e mais uma dúzia de coisas que temos vindo a perseguir neste país na crença de que o futuro passa certamente por ali. Agora é o que se sabe; um sistema de Ensino Superior frágil, desconfigurado, palidamente à procura de rumo...e com claro excesso de docentes face às suas necessidades. Contudo, estes, podem ter dado o seu melhor 5, 10, 15 anos...que ao contrário de todos os outros profissionais nem direito a subsídio de desemprego terão quando lhes chegar o "passe bem, gostámos muito, mas já não precisamos de si". Que anda esta gente a fazer? Porque negam a cada ano que passa um direito elementar que a todos os outros professores contempla? Será da palavra "superior"? Ser do "superior" deve querer dizer que não se precisa de comer, de beber, de pagar a conta da água e da luz, de dar escola aos filhos...Fica-lhes mal e, ainda por cima, se feitas as contas, não devem ser mais que uns meros trocos no orçamento de Estado.

Para além de achar uma injustiça, também me custa te ver diferente de ti, isto é, na outra margem do rio. É que caminhámos muitas vezes juntos, equacionado a justiça do mundo.

E tu também sabes que eu amo muito o que faço.

~CC~

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

E ainda...

Ainda estou aqui, embora um pouco esmagada pelos excessos das campanhas, incapaz de vir deitar achas numa fogueira cujo lume já pouco me diz.
Penso muitas vezes nos argumentos dos que dizem "não", não sei se os respeito, mas procuro escutá-los. Mas não compreendo esta defesa da vida como coisa biológica, afirmação celular, circunstância que tem que a todo o custo emergir. Deparo-me com vidas já existentes em tudo carentes de protecção e não os vejo lá. Hoje, uma imagem da Serra Leoa (creio que era RTP África...) atravessou, na sua imensa violência, o meu olhar e tive que desligar a televisão que tão pouco ligo. Era simplesmente uma criança de uns 10/12 anos a ser violentamente espancada por um adulto armado nas ruas esburacadas de uma cidade, aquela criança provavelmente morreu e quem a filmava deve ter manchado de lágrimas a lente da câmara. Vejo-as também despojadas de quase tudo aqui neste país, num dos bairros ditos "sociais" com os quais me cruzo. Estas vidas também precisam de defesa e não oico as vozes que agora tão alto se fazem ouvir. Provavelmente não é nada disto que está em discussão, dirão os mais legalistas...mas eu que me vicio na escuta dos outros mesmo quando os outros não são nada do que eu sou, eu divago a propósito disto a outros lados pelos quais a minha viagem também passa quando passa por aqui.
~CC~

Gatos e Marcelo....

Não sei se viram o programa desta semana dos Gato Fedorento. Quanto me apercebi não falaram, ao contrário da semana anterior, do referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez.
Esta semana, depois de algumas peças, aparecia Ricardo Araújo Pereira representando uma personagem que ria da rábula que tinha terminado, e dizia que, embora discordando do seu conteúdo, se tinha divertido e que não achava nada mal que nos fizessem rir apresentando posições com que discordava, desde que, no próximo programa, apresentassem outra rábula com a visão contrária.
Poucos minutos antes, Marcelo Rebelo de Sousa tinha comentado o brilhante momento de humor de domingo passado elogiando a RTP pela diversidade de perspectivas que nos davam sobre o referendo apresentando ele a sua posição a favor do "Não" e, logo de seguida, os Gato Fedorento com uma posição manifestamente contrária.
Na minha opinião, não podemos comparar um programa de análise com um programa de humor e concordo com o Gregório Salvaterra sobre o destino a dar ao espaço do professor Marcelo. Claro que os Gato Fedorento têm também uma posição. Já vi o Ricardo, num dos espaços de direito de antena, expor, bem a sério, o que pensa. Claro que, no programa da semana passada, a mensagem foi clara e que ouvi na rádio, esta semana, que se Marcelo podia influenciar algumas pessoas os gato, com a sua rábula, influenciariam muitos mais. Mas, penso que a personagem que apareceu esta semana não apareceu por acaso e que também não foi por acaso que, esta semana, não abordaram o tema do referendo. Ou melhor, continuaram a abordar o tema, não falando dele, de um modo muito inteligente e que mostra bem a diferença entre os dois programas e reforça a mensagem da semana passada.

Parabéns Gato Fedorento

sábado, 3 de fevereiro de 2007

Lembram-se?

Em 1982 já se discutia o aborto na AR. O tempo que vamos perdendo!...Jovem estudante de Sociologia, ainda a acreditar que a mudança também passava por ali, estive lá, nas galerias, mas não no dia em que aquela espantosa mulher chamada Natália Correia declamou estas acutilantes palavras que já vos mostro a seguir. A passear por aqui redescobri-as pela mão da maria estrela, aí vão:


"O acto sexual é para ter filhos" disse na Assembleia da República no dia 3 de Abril de 1982, o então deputado do CDS João Morgado num debate sobre a legalização do aborto. A resposta de Natália Correia, em poema, publicado depois pelo Diário de Lisboa em 5 de Abril desse ano fez rir todas as bancadas parlamentares, sem excepção, tendo os trabalhos parlamentares sido interrompidos por isso:

Já que o coito - diz Morgado -
tem como fim cristalino,
preciso e imaculado
fazer menina ou menino;
e cada vez que o varão
sexual petisco manduca,
temos na procriação
prova de que houve truca-truca.

Sendo pai só de um rebento,
lógica é a conclusão
de que o viril instrumento
só usou - parca ração! - uma vez.
E se a função faz o órgão - diz o ditado-
consumada essa excepção,
ficou capado o Morgado."
Lindo!
* A imagem é uma reprodução de Leonardo Da Vinci - Leda

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2007

Babel II

Vi Babel esta noite. Antes de sair de casa ainda vi as notícias e a última prendia-se com o relatório da ONU sobre o ambiente apresentado hoje em Paris. É quase meia-noite e penso enquanto escrevo que não é nada bom o futuro que se aproxima e pergunto-me/pergunto-vos o que faço/fazem no quotidiano para que mude alguma coisa. Revejo Babel e pegunto-me como chegámos aqui. A mensagem pode ser clara e como dizia a CC há uns dias , o amor há-de ser o antídoto para todos estes males, mas será que existe amor na mesma proporção em que existe tanto desamor? A menina japonesa que cresceu só por fora, rica de bens materiais mas com uma vida tão só e vazia por dentro; os polícias fronteiriços surdos e insensíveis à dedicação da mexicana ilegal, mas ama dedicada e cidadã cumpridora (vivia nos EUA há 16 anos e até alugava uma casa). Os meninos marroquinos que não vão à escola e que têm uma espingarda a sério para protegerem as cabras dos chacais. E os turistas que preferem a realidade vista de dentro do autocarro. É verdade que o autor do filme tentou deixar umas pinceladas de optimismo no meio daquela/desta Babel: a coragem do menino que se entrega ao polícia desde que este salve o irmão; o guia turístico que fica com o casal americano sem cobrar nada e mesmo sendo pobre ("só tenho dinheiro para ter uma mulher") não aceita o dinheiro que o americano lhe oferece quando deixa a aldeia; o rico japonês que talvez tenha percebido que a filha precisa mais da mão dele do que de atravessar a cidade num Mercedes último modelo. Talvez, talvez possamos fazer todos alguma coisa. Amanhã vou à praia apanhar conchas.

* Foto de Teufel, obtida em http://www.olhares.com/teufel

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2007

Os filhos

Vossos filhos não são vossos filhos.
São os filhos e as filhas da ânsia da vida por si mesma.
Vêm através de vós, mas não de vós.
E embora vivam convosco, não vos pertencem.
Podeis outorgar-lhes vosso amor, mas não vossos pensamentos,
Porque eles têm seus próprios pensamentos.
Podeis abrigar seus corpos, mas não suas almas;
Pois suas almas moram na mansão do amanhã,
Que vós não podeis visitar nem mesmo em sonho.
Podeis esforçar-vos por ser como eles, mas não procureis fazê-los como vós,
Porque a vida não anda para trás e não se demora com os dias passados.
Vós sois os arcos dos quais vossos filhos são arremessados como flechas vivas.
O arqueiro mira o alvo na senda do infinito e vos estica com toda a sua força
Para que suas flechas se projectem, rápidas e para longe.
Que vosso encurvamento na mão do arqueiro seja vossa alegria:
Pois assim como ele ama a flecha que voa,
Ama também o arco que permanece estável.

Kahlil Gibran (do livro "O Profeta")

"Splendini"

É assim que ele se chama em Scoop. Apesar de Splendini nao encontrei, neste Woody Alen o "splendor" de outros tempos. Mas vale sempre por ele próprio e não nego o prazer de reencontrar alusões, referências, citações. O seu incontornável Freud/Édipo, a propósito do bonito rapaz (não sei o nome do actor) que protagoniza o assassino de não sei quantas morenas de cabelo curto (tal e qual como a mãe dele que afinal tinha um pequeno defeito "era infiel"), o mesmo bom gosto de sempre na escolha dos trapinhos e as piscadelas de olho aos bons costureiros (o nome de Agnés B. aparece num cantinho de uma placa toponímica em Londres) e dos apartamentos que utiliza para filmar. Bem encontrada a ideia dos mortos que deixaram coisas por fazer e conseguem escapar, por um passe de magia, da barca da Ceifeira. Enfim, brilhante, não esplêndido, mas recomendável pela boa disposição que, pelo menos em mim, provoca.