Ela era muito pequena e magra, qualquer vento parecia que a dobraria, não deixando mais que a sombra. Tinha, no entanto, tido sempre um sorriso grande, uma boca cheia e sumarenta, não obstante se turvar por vezes com as nuvens dos caminhos e deixar o riso à porta de si.
Crescemos sempre com receio de que não vingasse, como as plantas que demoram a crescer e a ganhar raiz. A mãe levava-a aos médicos, sequiosa de um adubo que agarrasse à terra o último dos seus rebentos. Lentamente, lentamente se tornou uma mulher e mesmo quando já o era, ainda a tratavámos como se não o fosse. Creio que ainda nos espantámos quando foi mãe, porque a tínhamos dentro dos nossos olhos como uma menina.
E depois disso, era a menina dela ainda bebé de colo, apareceu afinal o que sempre tinhamos temido, mas agora tinha nome e nome de doença feia e quase fatal. Logo a ela, pensámos, que qualquer vento parecia poder dobrar. Nós chorámos entre nós e sorrimos perto dela.
Todos os tempos no hospital são tempos sem horas, como se os relógios tivesse avariado para sempre. E lembro-me de ver o sol e não o sentir, lembro-me de não conseguir sentir alegria por o Verão chegar. Mas ela não, ela disse-nos sempre que ia viver. Ela nunca perdeu uma noite de sono, nunca tomou nem uma das pílulas do esquecimento ou da alegria, nunca deixou de querer estar bonita. De repente, parecia que nenhum vento a poderia dobrar e que ninguém poderia duvidar de que a sua raiz estava bem dentro da terra.
Sim, ela viveu, mais forte do que jamais alguns de nós pode pensar. Ela era afinal uma rapariga forte. Passaram três anos depois dos vómitos que os liquidos de cores via intravenosa provocavam, dos suores, dos pesadelos. A pele dela ganhou cor, porque bonita ela sempre foi. Espera agora uma outra criança, depois de refazer a vida e ter deixado crescer em si o amor.
Está já em casa por recomendação médica, impaciente com a ideia do repouso absoluto, mas crente como sempre. Forte, como sempre. É preciso dizer bem das raparigas que são fortes. Eu preciso dizer bem dela.
~CC~
3 comentários:
Um texto forte.
Tristeza, esperança e alegria.
A força dos "fracos". :)
A força, muitas vezes, está onde menos parece estar...
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