segunda-feira, 7 de maio de 2007

por dentro do amor

Ocorreu-me naquele início de Verão um chamamento pelo cheiro dos bebés. Queria simplesmente ter um a que pudesse chamar meu e olhar para ele como um fruto nascido dentro do amor. Esqueci-me que estava simplesmente a meio do mestrado e que planeava ir para Àfrica realizar a tese. Sempre pratiquei a racionalidade do rumo dos afectos, a única aliás em que acredito verdadeiramente. E mal tinha pensado, já tinha acontecido, isto porque as conversas com o nosso corpo resultam em algumas adivinhações celulares (de céu, de célula e de sol).

Depois queria ter a criança em casa por causa do cheiro dos hospitais, por eles se vestirem de branco como a morte e a maior parte nos tratar como crianças pequenas sem vontade nem inteligência. Impossível contornar, contudo, algumas imposições. Passei então para a batalha contra a cesariana, modo que se tornou vulgar de trazer crianças ao mundo. Mas como as coisas correram mal acabei mesmo na dita cuja sala de operações, ainda que teimosamente e vitoriosamente contra a tesoura. Resolveu-se rápido, era apenas um pequeno pormenor.


Quando nos colocam a criança que tanto desejámos, mesmo que silenciosa, em cima da nossa barriga, que fazemos? O toque é o caminho natural dos dedos e assim foi o dos meus, o minímo perante o abraço que queria dar inteiro em recepção e aconchego. Ainda recordo os gritos das enfermeiras: não pode, não pode tocar na criança! Os meus dedos, diziam, não estavam suficientemente limpos, podiam trazer com eles doenças várias.

Eu não sei o que eles e elas sabem e devem saber muitas coisas, isto porque também já os vi salvar muita gente. Mas eu sei outras coisas. E ontem, pela textura do colo, calor das mãos e olhos nos olhos de riso, acho que fiz bem em ser eu a primeira a tocá-la, depois de cortado o cordão umbilical.

Nós já vamos a caminho da cumplicidade.

~CC~

3 comentários:

Cristina Gomes da Silva disse...

Da cumplicidade e da pertença. Eu sinto que pertenço às minhas, muito mais do que elas a mim.

j disse...

Parece-me que fizeste muito bem. É bom ler esta ternura, na pausa para o café.

Anónimo disse...

Ainda bem que existiu uma resposta ao chamamento... e foi muito melhor que a "encomenda"...
beijos cg